EXPOSIÇÃO / passada
A onda, a água e o mundo flutuante
A grande onda sobre Kanagawa (de 1830), assustadora, que destrói tudo ao quebrar-se sobre um barco de pescadores, de autoria de Katsushika Hokusai (1760-1849), influenciou muitos artistas ocidentais quando o conjunto de gravuras do japonês veio a ser conhecido no século XIX. Entre eles Van Gogh, Monet e o compositor Claude Debussy, que criou a sinfonia La Mer, depois de ver a beleza assustadora dessa xilogravura, que faz parte de uma série sobre o Monte Fuji.
A imensidão do oceano sempre instigou os artistas e é o que vemos na série de quatro gravuras de Gilberto Salvador, artista que velejou pelo alto-mar em um barco catamarã. A sinfonia sobre a água é apresentada junto das matrizes de metal e de outras quatro “pinturas” feitas a partir de impressões que deram errado e foram transformadas em monotipias.
Para Gilberto Salvador – que nasceu em São Paulo, em 1946, formou-se em arquitetura em 1973 pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) -, a arte é como uma partitura musical, um elemento de transformação. Vê a obra de arte como uma pequena semente que, ao germinar, expressa sensações e sentidos e transforma as pessoas, servindo como elemento de motivação para o mundo sensível.
Sua obra se caracteriza pela oposição entre o gesto solto e o traço rígido, as formas orgânicas e inorgânicas, entre o movimento e o estático. Nas suas telas, desenhos e gravuras, como as vistas nesta exposição, pode-se observar as formas vivas do mundo que dialogam com gestos abstratos, que muitas vezes podem se aproximar da geometria.
Viver no mar, nadar, mergulhar e velejar. Basta olhar que o mar acalma. O mar ajuda a criar. O catamarã, barco oceânico, que atravessa mares, que exige conhecer navegação marítima, o saber das direções do vento e de onde vêm as correntes marítimas. É essa natureza marítima que o inspira nessa sinfonia sobre a água. Esse convívio é necessário para Gilberto Salvador que velejou e foi em algum momento homem do mar.
Essa série de gravuras tem o balanço da água e as ondas que quebram. Quase sugerida é quase abstrata e também figurativa. É sua vida nas ondulações e nas formulações do movimento. Nem geométricas e nem totalmente orgânicas. São formas híbridas como as da natureza. Curvas, retas, linhas, manchas ao acaso e acidentais, podem ser gestuais ou mesmo simples respingos da tinta derramada sobre a chapa de metal. São ritmadas como na partitura musical.